Sou regularmente aqui questionada se faço cesariana eletiva sem indicação ou se faço cesariana a pedido ainda que a mulher aguarde o início do trabalho de parto. A resposta é não. Na prática, eu sequer preciso dar essa resposta, dado que dificilmente mulheres que fazem essa escolha chegam a me procurar. A bem da verdade, certa vez uma mulher chegou ao pré-natal com ideia fixa de cesariana e, munida de muita informação, ao longo do tempo mudou de ideia e pariu sorrindo na banheira, sem qualquer intervenção, acompanhada de sua mãe (tão bem informada quanto), em um parto cansativo e zero redondo, que dela demandou justamente o tal empoderamento que se constrói ao longo do processo.
Sou procurada pelo comprometimento com o parto natural, respeitoso, SEGURO e baseado em evidências.
Antecipando-me ao mimimi de sempre, aqui não me refiro às cirurgias com real indicação, eletivas ou não, a exemplo da placenta prévia total (tem uma série de posts aqui no feed sobre as indicações reais de cesariana, aliás recomendo a consulta). E que bom que elas existem né?! Ninguém nega que salvam vidas.
Para as que optam por cesariana, existem incontáveis colegas dispostos e ansiosos por fazer esse tipo de atendimento e realizar o desejo delas, muitos dos quais trabalham com planos de saúde. Dessa maneira, a cirurgia é agendada para o horário comercial e a mulher praticamente sequer tem gasto extra, dado que basicamente inexiste qualquer disponibilidade e uma cesariana dura em média 30’. Não teria nem sentido me procurar e pagar por uma cirurgia totalmente particular.
Ainda, francamente falando, eu não ocupo a vaga de uma mulher que busca parir com uma que não busca, visto que, no Rio de Janeiro e em todo o Brasil, é facílimo encontrar profissionais que façam cesarianas eletivas. Em contrapartida, é consideravelmente difícil encontrar quem assista ao parto sem interferir desnecessariamente (é trabalhoso e tem custo pessoal né?). Não tem cabimento, portanto, eu não valorizar e priorizar totalmente aquelas que lutam por um parto respeitoso.
Fora isso, cabe minha opinião pessoal quanto às cesarianas eletivas sem indicação, fora de trabalho de parto: são um absurdo, um baita desrespeito ao bebê e deveriam ser proibidas. Ainda que durante o pré-natal, depois de explicados e expostos em minúcias todos os riscos e benefícios do parto normal, contra todos os riscos da cesariana, a gestante opte pela cirurgia, ela deveria SIM aguardar o trabalho de parto começar. É assim que um bebê mostra que está pronto para nascer e é o mínimo que se deve ser feito para proteger de riscos absolutamente desnecessários um indivíduo que não pode escolher.
Pros que me tem como radical (adoro!), destaco uma decisão por cesariana que eu e minha equipe acolhemos: quando, já ao final de um trabalho de parto exaustivo e desafiador, a mulher realmente escolhe desistir, seja porque está muito difícil, cansativo ou penoso, seja porque sim. Nesse caso, ela é respeitada, acolhida e sua cirurgia é prontamente realizada, de maneira respeitosa e humana. Deixando bem claro que essa foi uma escolha consciente e não o esperado desespero da fase de transição – que sabemos acontecer e contornamos com adequado suporte emocional (obrigada, doulas!), técnicas para alívio da dor e analgesia em último caso. É comum acontecer? Não, nem de longe! Especialmente se o pré-natal for de fato informativo, expositivo e empoderador. Tenho menos de uma por ano, por curiosidade aqui.
Aproveito para deixar minha percepção a respeito dessa decisão: é bem difícil que uma mulher legitimamente bem informada e instruída escolha uma cesariana. E aqui não julgo ou culpabilizo mulheres, muito menos determino quem seria mais ou menos mãe (aliás que preguiça disso!). Julgo o sistema que diariamente engana, infantiliza, desacredita e amedronta. O mesmo sistema que pouco (ou nada) informa. Mulheres escolhem ou escolhem por elas? A autonomia é real ou inexiste?