Para quem não sabe, VBAC é a sigla em inglês para Vaginal Birth After C-section ou, em bom português, Parto Normal Após Cesariana. Essa sigla ocasionalmente vem acompanhada de números (por ex.: VBA2C ou VBA3C), que indicam a quantidade de cesarianas anteriores. Ainda hoje, ouvimos uma frase muito batida (e totalmente equivocada) sendo repetida e perpetuada em consultórios e plantões afora:
“Uma vez cesárea, sempre cesárea.”
Mito! Inclusive cansa minha beleza.
O parto normal após cesariana não só é possível como é recomendável, uma vez que, quanto mais cirurgias – principalmente as que não possuem indicação estrita – a mais riscos são expostos mãe e bebê. Em geral, a mulher que já teve uma cesariana pode (e deve) SIM passar por uma prova de trabalho de parto e, se bem assistida, as chances do parto normal ter desfechos positivos e ser inclusive espontâneo/natural são muito altas (>80%).
Mesmo assim, sabe-se que há bastante medo envolvido na decisão pelo VBAC. O principal deles concerne à rotura uterina. O bicho-papão do “útero que explode” atormenta muitas grávidas (e alguns médicos). Importantíssimo falar sobre e desmistificar esse assunto.
A rotura uterina é sim o principal risco de um VBAC. Ela pode acontecer durante o trabalho de parto, geralmente já no período expulsivo, quando o útero se rompe (usualmente na região da cicatriz de cesariana anterior), levando à hemorragia, protrusão de partes fetais na cavidade pélvica, hipóxia fetal, e, em casos mais graves ou não prontamente diagnosticados e tratados, morte materna e/ou morte fetal.
O risco de rotura uterina existe para todas as mulheres, mesmo as que nunca tiveram filhos ou só tiveram partos normais anteriores. Para essas, o risco é, em média, de 1/10.000. Já no caso de mulheres com uma cesariana anterior, o risco de rotura uterina em VBAC é de aproximadamente 0,1%, igualmente bem baixo e quase inexpressivo.
Com 2 cesáreas anteriores, esse risco sobe para 0,6% – ainda muito baixo e estatisticamente similar à mulher que só teve uma cesariana. Já no caso de 3 cirurgias prévias, o risco sobe para 2,5% – significativamente maior do que uma ou duas cesarianas. Ainda tratando-se de um risco baixo, este deve ser cuidadosamente considerado.
Portanto, para uma tentativa de VBA3C, há de se colocarem na balança os riscos de uma cesárea de repetição x riscos de uma ruptura uterina. Ou seja, colocar-se-ão na mesa também todos os riscos que envolvem optar por nova cirurgia, tais como infecção, hemorragia, trombose, lesões de órgãos adjacentes, histerectomia etc, bem como os benefícios pro bebê que se perdem, principalmente os relacionados ao vínculo, à amamentação e à imunidade.
Fundamental destacar que a opção pelo VBA3C é uma decisão subjetiva, que deve ser discutida entre casal e equipe. A família deve pesar todos os potenciais riscos e benefícios envolvidos e, por outro lado, a equipe também precisa estar confortável com esse atendimento. A informação correta e aprofundada é, mais do que nunca, primordial.
A chance de um parto normal após uma ou duas cesarianas é altíssima, aproximando-se da de quem nunca foi operada. A grande maioria das mulheres, se bem assistida, vai parir sem problemas. A única ressalva é para aquelas que sofreram cicatrizes uterinas corporais na cesariana anterior. Ou seja, se o útero foi cortado de forma vertical, “em T” (quando a incisão é feita no corpo uterino, em vez do segmento inferior), há indicação relativa de uma nova cesariana – porque as chances de rotura uterina aumentam muito.
De qualquer maneira, tenha em mente que, em qualquer parto, especialmente nos VBACs, cada intervenção aumenta um pouco mais o risco, pra mulher e pro bebê. Idealmente, portanto, o parto deve acontecer de maneira espontânea e natural, reservando-se as intervenções oportunas, incluindo nova cesariana, pras mulheres que realmente precisarem delas.