Lamento ser a portadora da notícia, de maneira tão direta e dura. E devo salientar, logo de cara, que não estou fazendo “reserva de mercado” ou similar; não estou querendo disseminar o medo com objetivo de trazer todo mundo pra minha agenda – eu quase nem tenho mais agenda pra esse ano, pra falar a verdade. É que são incontáveis as mensagens que recebo diariamente com relatos tristes e/ou violentos a respeito dos nascimentos pelo plano de saúde (ou por plantões de maternidades particulares). Não se trata, tampouco, apenas de percepção do meu próprio inbox, é estatística: quase 90% dos nascimentos pelo plano no Brasil são cesarianas. Via de regra, os partos normais, quando acontecem, são de risco habitual (baixo risco), partos muito rápidos (que ocorreriam quase que a despeito da assistência daquela equipe), partos com muita intervenção desnecessária ou violência obstétrica ou… pura sorte.
Pra não dizer que estou atacando colegas de profissão: sabe quanto um plano de saúde paga, em média, por um parto? De 500 a 1000 reais. Esse número assim, solto, parece até ok, mas não é. Além de ser o honorário pelas horas gastas (sabe-se lá quantas, pois parto não tem regra), pelo atendimento, pela full disponibilidade (pode ser de madrugada, no final de semana, no feriado, no aniversário do marido, no Natal), o valor também é usado para cobrir o custo disso tudo: desmarcar todo o consultório (lembra que médico de plano normalmente tem consultório lotado?), remarcar para outro dia, locomoção, atualizações constantes (a gente nunca para de estudar). Não é barato não… e a conta não fecha. Vai ter quem faça parto humanizado pelo plano? Deve ter aquele 1% perdido por aí, seja ainda construindo carreira, seja corajoso, seja alguém que acredita na causa (e não possui boletos pra pagar). Mas não é regra, é difícil de encontrar – e eu acho difícil de acreditar.
O que o médico de plano faz, então? Ou ele atende parto de qualquer jeito e acelerando o máximo possível para que tudo acabe logo ou ele indica a cesariana.
Daí agenda logo as cesarianas todas juntas numa quinta ou sexta de manhã, bem rapidinho, não desmarca o consultório, fica com tudo controlado e organizado na vida (sorte a deles). Fosse esse profissional honesto desde o começo, avisando que não atende partos normais, eu até entenderia e acharia justo – trabalhar com parto humanizado não é fácil.
O que pega é o que justamente deve estar te enganando neste momento: esse GO é simpático e não avisa nada não. Fala coisas bacanas, te atende desde sempre, é muito legal com você, quiçá com sua família. Esse profissional pode ter participado de algo importante na sua vida: resolveu um mioma, operou uma tia, atendeu uma amiga, é seu médico desde que era bem novinha, salvou alguma colega de uma situação difícil (um aborto? Um câncer? Tanto faz). Esse GO diz que é lógico que vai “fazer” seu parto – “Em estando tudo bem, por que não um parto normal?”, “Vamos tentar parto normal sim!”. Durante o pré-natal, ele invariavelmente vai te encher de exames, vitaminas, ultrassonografias, prescrições e repousos. Você vai se sentir cuidada, não vai? “Como esse médico de confiança e tanto amor comigo vai me levar pra faca?”, você se pergunta. E aí está o pulo do gato.
Esse monte de exame e simpatia é justamente o que te faz deixar de questionar. É o que te deixa envolvida e com sensação de amparo e segurança – e não é isso que queremos pros nossos filhos? Em meio a isso, você não vai achar ruim fazer mais um exame. Tomar mais um remedinho. Suspender o exercício físico pois pode “fazer mal pro bebezinho”. É possível que você ache todo o resto – inclusive esse meu texto – um grande exagero. Aí, em um belo dia, lá nas 37 ou 38 semanas, algo errado vai aparecer. Um bebê que cresceu demais ou de menos. Um desconforto. Uma perda de líquido “fora do normal”. Uma falta de dilatação. Qualquer coisa que abale sua confiança ou sua segurança. Seu GO vai indicar a cesárea e você vai, AGRADECIDA PELA SALVAÇÃO. E vai chegar no final do meu texto com raiva porque eu estou te dizendo que: não era salvação, era enganação (não era amor, era cilada).
Se você ainda está grávida e achando que vai parir com seu médico fofinho do plano: NÃO VAI.
Ou ainda: vai ter sim um parto normal. Aquele que eu descrevi lá no começo: rápido, liso e bem sortudo (ou bem violento). Eu sinto muito.