Recebo com frequência perguntas sobre Parto Domiciliar Planejado na caixinha de perguntas dos stories. Evito alongar-me muito no assunto por um motivo simples: não atendo ou sou backup de nascimentos em casa (exceto de pacientes cuja ideia era o parto hospitalar e que, por ventura, tenham acontecido acidentalmente e, ainda assim, internei para assistência ao pós-parto imediato, encontrando-as diretamente no hospital).
Aqui no RJ, o CREMERJ, até pouquíssimo tempo atrás, não permitia que médicos oferecessem atendimento ou backup planejado ao parto em casa. Um médico só poderia prestar atendimento caso houvesse transferência para o hospital e esse profissional tinha que ser o disponível em plantão. O assunto ainda está em discussão e, enquanto isso, eu me baseio pelo que o Conselho orienta.
Certo?
Mas já que perguntam tanto, vamos falar de parto em casa.
Primeira coisa: planejar um PD é opção para gestações ESTRITAMENTE de risco habitual (antigo baixo risco). Tem alguma comorbidade? Alguma doença associada? A gestação deixou de ser risco habitual em algum momento? Não deverá parir com segurança em casa. Ainda que o problema só apareça lá no finalzinho, o parto em casa pode ser contraindicado a qualquer momento (inclusive durante o próprio trabalho de parto, caso detectado algum risco, seja ele qual for: mecônio, FCF não tranquilizadora, hemorragia pós parto, ou se a gestante desistir do plano inicial e solicitar transferência para analgesia, por exemplo). Eu sei que existem equipes que individualizam casos e não estou aqui para julgar, mas, pela literatura disponível a respeito, a regra é não haver risco algum. Além desse critério básico, há alguns outros para se determinar a elegibilidade da família ao PD e que também devem ser seguidos à risca:
– A gestante deve residir próximo à maternidade ou hospital de referência (a combinar com a equipe);
– Assistência deve ser por equipe treinada, experiente e extremamente capacitada em partos domiciliares (lembrando que doulas são importantíssimas, mas não constituem parte técnica do parto e JAMAIS poderão assistir a um nascimento sozinhas, além de serem de escolha exclusiva da mulher);
– Planos A, B, C (…) traçados com antecedência para qualquer demanda de transferência ou urgências/emergências;
– Total ciência, por parte da gestante, de todos os riscos envolvidos na escolha para que, em corresponsabilidade com a equipe, possa tomar decisões amplamente informadas e conscientes.
É preciso que a mulher entenda que o parto em casa não é um degrau “a mais” para quem quer parir, não é coisa de mulher “corajosa”, “índia”, “descolada”, ou “mais” qualquer coisa. Parto domiciliar não é melhor que outros tipos de parto, é uma possibilidade e não é pra todo mundo. Serve muito bem àquelas que assim o decidem, sem influências ou pressões externas (mesmo na pandemia, viu? Medo de pegar COVID não é motivo pra decidir por parto domiciliar se você nunca tinha cogitado essa possibilidade antes), com informação abundante e de qualidade. Decisões precipitadas, sem a devida ampla informação e reflexão podem ser no mínimo irresponsáveis, além de poder não ser mesmo o melhor para aquela família.
E, muito embora aqui no RJ o médico seja desencorajado de assistir partos em casa, é fundamental compreender que, no ambiente doméstico, o médico, a enfermeira obstetra ou obstetriz FARÃO A MESMA COISA, dada a característica da estrutura. A equipe estará pronta pra atender a mulher ou o bebê se necessário for e daí a importância da experiência e material adequados (revisados 1000x por ano).
O que significa que em casa não tem analgesia (farmacológica), não se pode intervir de tantas maneiras (e nem se deve, afinal, parto em casa é pra ser liso, redondo e fisiológico), não tem ambulância na porta, helicóptero com UTI, nada disso.
Então, ainda que na sua cidade o médico possa atuar em um parto domiciliar, isso não significa que você estará mais ou menos segura. A segurança de um PD se dá pelo bom planejamento, treinamento adequado da equipe, gestação sem riscos associados e família segura de suas decisões.