Doppler de artérias uterinas

O estudo do doppler das artérias uterinas, que irrigam o útero e por conseguinte a placenta, pode ser realizado em diferentes épocas da gestação e com finalidades diferentes. Ao realizarmos o exame, desejamos avaliar a resistência do fluxo sanguíneo durante o ciclo cardíaco (sístole e diástole).

Essa resistência é fisiologicamente maior no início da gravidez, época em que é comum se evidenciar a famosa incisura de artérias uterinas, traduzida pelo aumento importante da resistência ao fluxo sanguíneo no início da diástole (fase de relaxamento do coração). Com o avançar da gravidez, caso haja uma placentação adequada, essa incisura some e a própria resistência total dos vasos vai diminuindo. Se a placentação for inadequada, a resistência pode permanecer elevada e as incisuras (uni ou bilaterais) continuarem presentes. A melhor forma de medir a resistência das artérias uterinas é através do seu índice de pulsatilidade (PI).

Atualmente, preconiza-se a avaliação da resistência das artérias uterinas já no primeiro trimestre, na mesma época da avaliação morfológica (que já avalia translucência nucal, osso nasal, fluxo no ducto venoso e na válvula tricúspide, além da própria anatomia fetal), em idade gestacional (IG) entre 11 semanas e 13 semanas e 6 dias ou com um comprimento cabeça nádega (CCN) fetal entre 45 e 84 mm.

A avaliação das artérias uterinas nessa época é utilizada, em conjunto com detalhada anamnese, como forma de rastreio de pré-eclâmpsia (PE), doença que afeta 2% das gestações totais e é causa importante de morbimortalidade fetal e materna, principalmente quando de início precoce, antes de 34 semanas. Além disso, a PE também aumenta o risco de complicações maternas e fetais em longo prazo.

Acredita-se que o mecanismo que leva à PE seja uma implantação inadequada da placenta, o que levaria a um aumento da resistência nas artérias uterinas.

A avaliação ao doppler desses vasos entre 11s e 13+6s, juntamente com: 1) dados da história materna (raça, presença de hipertensão arterial prévia, história de PE em gestação anterior – mais importante – ou de mãe/irmã); 2) fatores biofísicos maternos (peso, altura e pressão arterial média – PAM); e 3) dosagem fator de crescimento placentário (PlGF) para triagem de PE podem identificar cerca de 90% das gestantes que irão desenvolver a doença que poderá levar ao parto antes de 34 semanas em casos mais graves; 75% das gestantes que desenvolverão PE antes de 37 semanas e cerca de 45% das que terão PE após 37 semanas. Se excluirmos a dosagem do PlGF (ainda pouco realizada), as taxas de detecção são 80%, 70% e 40%, respectivamente, com uma taxa de falso positivo de 10%.

A avaliação da resistência das artérias uterinas é mais importante na janela de IG citada acima por hoje existirem evidências robustas de que, em mulheres com alto risco de PE (maior que 1/100), o uso de AAS á noite, entre 12 e 36 semanas pode diminuir em até 80% a incidência de PE antes de 34 semanas e em 60% antes de 37 semanas. O início tardio do uso de AAS, principalmente após 16 semanas, não parece trazer benefícios na prevenção da doença e não está recomendado.

Já entre 20 e 24 semanas, a avaliação combinada de história materna, dados biofísicos e doppler de artérias uterinas pode detectar o risco de PE em 96% dos casos que surgirão antes de 34 semanas, 80% dos casos antes de 37 semanas e 44% das PEs após 37 semanas, com taxa de falso positivo de 10%. O rastreio entre 30 e 34 semanas usando os mesmos parâmetros acima tem taxas de detecção de 79% das PEs antes de 37 semanas e 40% após 37 semanas, com taxa de falso positivo de 5%.

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